quinta-feira, 30 de março de 2017

EXPANSÃO TERRITORIAL, CONQUISTA E COLONIZAÇÃO TRANSATIVISTA SOBRE MULHERES




A expansão territorial é uma prática histórica, milenar de sociedades/grupos dominadores, ela acontece em TODOS os processos de dominação - TODOS, basta checar nos livros de História. Invadir e tomar espaços é, ao mesmo tempo, uma prática comum de qualquer processo de conquista e colonização e, no caso específico da colonização do SEXO MASCULINO sobre o SEXO FEMININO, uma poderosa METÁFORA DO ESTUPRO, este a principal e mais fundamental arma de domínio do sexo masculino sobre o feminino.

Por que motivo o transativismo tem como pauta invadir e tomar os espaços exclusivos que as mulheres lutaram tanto pra conquistar sob o argumento REAL e URGENTE de que a SEPARAÇÃO de alguns espaços por SEXOS era fundamental para manter a SEGURANÇA e a INTEGRIDADE do sexo feminino, aquele que é instituído, historicamente, como o SEXO VIOLÁVEL?

Porque o transexualismo, é em si, um MOVIMENTO DE EXPANSÃO do domínio masculino sobre as mulheres - o sexo masculino, certo de sua superioridade, precisa invadir e controlar o espaço mais fundamental de controle e dominação do sexo feminino: a sua GÊNESE, ou seja, a própria DEFINIÇÃO do que é ser uma mulher.

Ao afirmar que "se sente" mulher sem nunca ter experimentado MATERIALMENTE as práticas de violência e limitação que o patriarcado direciona ESPECIFICAMENTE às fêmeas humanas através da SOCIALIZAÇÃO feminina para forjá-las como o constructo social submisso, passivo e inferior, a MULHER, o sexo masculino, no exercício de sua AUTORIDADE sobre as mulheres, almeja nos convencer que a condição de inferioridade feminina NÃO é uma realidade material socialmente forjada pela violência e limitação que o patriarcado impõe as pessoas nascidas no SEXO FEMININO, (como historicamente vêm denunciando as feminismo), mas sim que a condição feminina, submissa, passiva e inferior, é um SENTIMENTO - algo biológico que acontece naturalmente no cérebro inferior das mulheres e, segundo o transgenerismo, de alguns homens "femininos" ou um desígnio metafísico expresso através de uma alma ou um espírito inferior feminino - que pode ser acessado por homens pela reprodução e reafirmação dos estereótipos que eles mesmos criaram pra nos limitar, reduzir e subjugar. Assim, a partir desse processo, em que eles se julgam capazes de acessar através da reprodução dos estereótipos femininos o "sentimento" sobre ser mulher (a submissão, a passividade, a delicadeza, a inferioridade perante o sexo masculino), eles estariam, portanto, autorizados a dizer o que é uma mulher, reafirmando, novamente, a mulher como essa condição de submissão e inferioridade  que eles pretensamente acessam pelos estereótipos patriarcais femininos, negando a condição da mulher como aquela socialmente construída pelas violências e limitações patriarcais conforme as denuncias feministas. 

Expandir seu domínio invadindo e controlando nossos territórios físicos é parte da estratégia de colonização dos homens para expandir também seu domínio sobre  nossos espaços linguísticos e cognitivos - justamente os espaços onde se fundamentam as possibilidades de transformação radical da nossa condição - impondo a nós os seus próprios sentidos e significados sobre a nossa condição. Esse é o objetivo primeiro e último dessa sanha transativista por tomar os espaços femininos, conquistados e construídos pelas mulheres para nossa própria segurança, inclusive o mais importante desses territórios: o espaço (físico, simbólico, linguístico e cognitivo) do próprio movimento feminista, o único dos espaços habitados pelas mulheres em que as estratégias de expansão, invasão, colonização e dominação do sexo masculino sobre o feminino eram radicalmente apontadas, criticadas e combatidas. 

Abram o olho. Saiam desse transe trans.




quarta-feira, 29 de março de 2017

TROCANDO UMA IDEIA SOBRE A CONDIÇÃO LÉSBICA

Esse texto surgiu de uma recente conversa com uma leitora nos comentários de um dos posts desse blog, então eu quero agradecer à Mulher em Luta do Feminismo Radical Negro e Anarquista pela interlocução que fez mover meu pensamento. :)

Bem, como disse à ela, eu digo aqui de novo: eu não tenho certezas rigorosas sobre essas questões, então o que vou compartilhar aqui com vocês são reflexões e ensaios de pensamentos, minhas queridas filhas de Safo, as herdeiras de Valkírias, Amazonas e Icamiabas. <3

Pra começar, eu acredito que apesar de lésbicas reproduzirem [algumas mais fortemente que outras] modelos e padrões heterossexuais de relacionamento, nosso lugar na sociedade heterossexual é muito radicalmente diferente dos papéis heterossexuais, então eu já concordo com a crítica que muitas de nós fazem sobre usar termos heterossexuais pra definir a nós e a nossos relacionamentos, termos como "lésbicas masculinizadas", "femmes", "relacionamentos abusivos". A gente sempre foi narrada e definida (a nossa história, assim como a nossa condição) pela linguagem e pela racionalidade patriarcal (são elas que conferem inteligibilidade a nossa existência no mundo e para nós mesmas) e não nos tem sido permitido acessar a nossa história, a história da existência e da resistência lésbica no processo de desenvolvimento das sociedades no tempo e no espaço, senão, e ainda sim muito pouco, pelo viés patriarcal; dessa forma, sem conhecer nosso passado, dificilmente seremos capazes de nos significar a nós e a nossas experiências, politicas, afetivas, sociais, a partir de nós mesmas, de nossos referenciais, no presente, e sempre estaremos dando sentido as nossas existências através dos significados que o patriarcado impõe sobre nós.

Nessa perspectiva, não nos são oferecidas muitas alternativas a não ser reproduzir/desdobrar esses sentidos nas nossas experiências materiais para que possamos existir materialmente através do sentido que tem sido dado as nossas existências (pois é impossível existir fora de qualquer sentido), e dificilmente sairemos desse ciclo de nos significar com os sentidos patriarcais e moldar nossas vivências a eles para que tenham sentido (não sei se estou sendo clara, me digam, pfv). Mas, ainda sim, a gente sabe que as vivências lésbicas extrapolam os sentidos patriarcais, justamente porque, numa sociedade falocrática, a construção de afetos e sexualidade ginocentrada é revolucionária, ainda que esforcem por encaixá-las e reduzi-las aos padrões heteronormativos. O que eu acredito é que a gente precisa liberar nossas experiências desses significados patriarcais e heterocentrados e perceber as nuances e particularidades que fazem com que relações lésbicas, por mais que se esforcem pra nos fazer crer que sim, elas não se encaixam nesses padrões heteropatriarcais. Lésbicas inconformes ao gênero não estão tentando se masculinizar, relações entre lésbicas inconformes ao gênero e lésbicas mais adequadas a ele não são nem de longe o mesmo que relações heterossexuais, problemas entre casais lésbicos, por mais violentos que possam ser, não tem o mesmo fundamento dos abusos enraizados na misoginia patriarcal que permeiam as relações heterossexuais - negar isso é apenas pautar a condição lésbica e a afetividade e a sexualidade lésbica de um ponto de vista hetero/falocentrado.

A gente precisa enxergar e significar as relações e a condição lésbica a partir de outros referenciais, cravados, enraizados, no nosso passado coletivo, na nossa própria história, nas nossas vivências, nas nossas próprias concepções de mundo, na nossa ética, na nossa estética e na nossa própria poética. É um trabalho enorme, mas a gente precisa começar a fazer. Um passo importante e fundamental pra isso é a gente recomeçar a escrever a nossa História, é a gente buscar o que já foi escrito, trazer isso à tona, buscar o que já foi produzido em termos de nossas memórias, sobre o nosso passado, é conhecê-lo, falar dele, escrever sobre ele, desdobrá-lo em literaturas, música, cinema, artes de todo tipo, em políticas, em sociabilidades, em conversas de bares, em afetos, enfim, fazê-lo presente na gente, no nosso corpo individual, mas, sobretudo, no nosso corpo coletivo. É a partir dele que a gente vai gerar os sentidos pra falar da nossa condição presente, pra entender porque há violência em relações lésbicas, porque ainda reproduzimos a heteronorma em nossas relações, pra entender onde conseguimos romper com ela e como fazer pra romper ainda mais... é a partir dos nossos próprios sentidos e significados que precisamos fazer isso, e não dos sentidos patriarcais, como historicamente temos sido impelidas a fazer desde sempre, pra continuarmos sendo limitadas a eles e pra nos mantermos, assim, sob seu jugo.

Olha, a gente precisa muito conversar sobre nós. A gente precisa se conhecer, falar sobre a nossa condição, sem parar o tempo todo. A gente precisa criar espaços exclusivos, debates, eventos, espaços de troca e de lazer, espaços lúdicos, a gente precisa ser, de fato, uma comunidade, em seu sentido mais pleno, com passado, com presente e com futuro. Enfim, com uma cultura e uma ética lésbicas.

E pra continuar (porque esse debate não pode parar,né?), eu vou compartilhar aqui nesse hiperlink esse texto ótimo que aponta de forma bem específica pra isso que tô falando aqui a partir do exame dos casos de violência dentro do próprio movimento organizado de lésbicas feministas. Recomendo que quem não leu, leia.

E vamos conversar. <3


quarta-feira, 22 de março de 2017

TRANSEXUALISMO É CURA HOMOSSEXUAL

Vocês conseguem imaginar uma série de programas sobre crianças lésbicas no Fantástico? E um programa de crianças gays na Fátima Bernardes? Programas com temática CRIANÇAS HOMOSSEXUAIS onde pais e mães discutem sobre como descobriram muito cedo que suas filhas e filhos eram homossexuais porque só queriam estar entre crianças do mesmo sexo, gostavam de brincar com brinquedos considerados adequados para crianças do sexo oposto, queriam se vestir e usar adereços atribuídos ao sexo oposto, demostraram muito cedo interesse afetivo em jovens do mesmo sexo... Oras, durante muitas décadas, era assim que os responsáveis (tanto os mais caretas, conservadores e punitivos quanto os mais progressistas,tolerantes e compreensivos, desconfiavam que seus filhos pudessem ser homossexuais, porque uma das tantas manifestações da homossexualidade pode ser (não é obrigatória, mas é bastante comum) a ruptura com os padrões e papeis de gênero estabelecidos. Sabemos que muitas meninas lésbicas,que se percebem lésbicas desde cedo, rejeitam os estereótipos de feminilidade e os papéis sexuais femininos ainda na infância,e o mesmo pode acontecer com meninos gays sobre os estereótipos de masculinidades. Ainda que não seja determinante ou obrigatória sobre a sexualidade de uma criança/adolescente, a ruptura com os estereótipos de gênero e papéis sexuais sempre foi um certo tipo de alerta para os responsáveis em relação às possibilidades de orientação sexual de suas crianças, todo mundo sabe disso. Há décadas. Talvez até há séculos.

Vocês chegaram a ver algum programa numa grande emissora abordando o tema CRIANÇAS HOMOSSEXUAIS e celebrando a
liberdade e a sexualidade dessas crianças?

Não, né? Claro que não.

Primeiro porque o mesmo público que assiste tranquilamente programas sobre crianças trans, hormonização, medicamentalização e mutilação de crianças e adolescentes ia ficar escandalizado com crianças lésbicas/gays na TV; é o mesmo público que não admite sequer beijo homossexual entre adultos nas novelas. Ao passo em que o transexualismo vem sendo cada vez mais aceito e celebrado nas mídias, nos meios progressistas e até em alguns mais conservadores (vejam o caso do Tammy Gretchen, que quando se afirmou lésbica caiu no escárnio e no ostracismo, mas ao transicionar para homem ganhou simpatia até dos correligionários políticos do Bolsonaro; vejam o caso do Iran, país que proíbe, pune e encarcera homossexuais, mas incentiva e financia cirurgias de "redesignação" sexual e aceita plenamente transexuais como cidadãos )

Segundo porque iam (médicos, psicólogos, psiquiatras, educadores, juristas) dizer (como sempre fizeram em relação à homossexualidade) que tudo isso que está sendo elencado como indício de comportamento homossexual não passam de estereótipos de gênero sendo explorados pela natural curiosidade infantil/adolescente, e que seria ainda muito cedo - a infância e os primeiros anos da adolescência - para que uma criança ou jovem defina sua sexualidade de maneira objetiva apenas pela simples experimentação curiosa do mundo - esse sempre foi o discurso vigente e aceito sobre a relação das crianças com os estereótipos de gênero e papéis sexuais quando a suspeita era de que pudessem ser homossexuais por experimentarem os estereótipos destinados ao sexo oposto e/ou rejeitarem aqueles destinados ao seu. Mas esse discurso (muito sensato, a meu ver, e com o qual boa parte da população com um pouco de bom senso sempre concordou) não serve mais para avaliar crianças em caso de transexualismo. Crianças de 2/3/4 anos estão sendo diagnosticadas como transexuais simplesmente pelo menos motivo pelo qual não deveriam ser apressadamente apontadas como homossexuais: porque gostam de brincar e experimentar coisas que a sociedade convencionou que são coisas do "gênero oposto". Uma menina de 3 anos de idade que apresenta interesse por carrinhos, aviões e peças de montar com forma e cores variadas em vez de se interessar por ursinhos, bonecas e casinhas cor-de-rosa, vai ser logo convencida por seus pais - que provavelmente foram convencidos pela TV e pelo discurso das autoridades médicas/psicológicas e jurídicas - que "nasceu no corpo errado". É possível que os pais passem algum tempo insistindo para que a criança se adeque ao que eles creem ser um modelo correto de comportamento para meninas (gostar de rosa, de vestidos, de laços, ser delicada e meiga, brincar de bonecas) e diante na recusa insistente da criança - que quer apenas descobrir o mundo e brincar com aquilo que prefere, ou com o que mais exercita seu desenvolvimento cognitivo - em se adequar, os próprios pais e médicos se encarregam de forjar nela a ideia de que tem algo errado com ela por se comportar daquela forma. Assim começam a forjar uma consciência transexual numa criança através de uma socialização transexual de uma criança insubmissa e livre, que poderia até ser, talvez, mais tarde, mesmo uma criança homossexual (ou não) interessada em explorar e aderir aos afetos e padrões convencionados ao outro sexo.

Se as pessoas sempre aceitaram que se interessar por estereótipos e papéis convencionados ao sexo oposto nunca foram o suficiente para definir se uma criança se tornaria homossexual ou não (embora muitas vezes a ruptura com os padrões designados a seu sexo pudessem sim ser um - dentre tantos - indicativos disso) porque tá todo mundo acreditando em criança trans?

Em breve não existirão mais homossexuais. Crianças e jovens insubmissos ao gênero por motivações homoafetivas e homoeróticas serão convencidas desde cedo pela criação de uma socialização e uma consciência transexual, a transicionar.

Ser uma adolescente lésbica, sobretudo para as mais inconformes ao gênero (as chamadas "butch", "bofinhas", "caminhão") é um processo violento e doloroso de exclusão, escárnios, desafetos, negativas, agressões e destruição da autoestima. Imagino os efeitos que devem surtir na cabeça de meninas de 6, 8, 11, 13, 15 anos que se sentem plenamente capazes e desejam ser livres, audaciosas, corajosas e respeitadas como os meninos são, mas que cresceram ouvindo e aprendendo que seu sexo é sujo, castrado e imoral, que sua inteligencia e sua existência são inferiores, desprezíveis e incapacitadas,imagino como deve ficar a cabeça delas quando são desde cedo convencidas de que existe uma forma delas acessarem tudo que é do homem, que existe uma forma de elas se tornarem homens também. Imagino ainda, o grande conflito que deve ser constatar - quando se amadurece as vivências e a compreensão - que nada que o processo de transição lhes ofereça, apagará toda violência castradora que viveram cada vez que foram identificadas como sexo feminino e o fato de que tomar hormônios e mutilar os seios não lhes dará a propriedade sobre o exercício dos privilégios masculinos. Transexualismo existe para reconverter homossexuais à heteronorma através de um rearranjo dos casos de insubmissão ao gênero: realocando e submetendo as pessoas insubmissas ao que deveria ser o seu gênero no outro gênero e readequando seus corpos ao sexo correspondente ao gênero ao qual ela passa a pertencer, se conservam os códigos e a ordem regime heterossexual que deve vigorar para que vigore o próprio patriarcado. No patriarcado, o regime heterossexual não pode se desfacelar, e a maior ameaça a ele é a homossexualidade, mais precisamente a homossexualidade feminina, a CONDIÇÃO LÉSBICA. É manutenção dos estereótipos de gênero e da heterossexualidade que sustenta o patriarcado. É a conversão de lésbicas em homens trans, ou seja: em pessoas dentro da norma heterossexual, o sentido mais profundo e o primeiro e último objetivo do transexualismo. Apagar a existência lésbica, a história lésbica, a resistência e a insubmissão lésbica à aos padrões da heteronorma ressignificando lésbicas como homens é a finalidade principal do transexualismo.

Transexualismo é misógino e lesbofóbico. Transexualismo é cura homossexual. Transexualismo é apagamento e aniquilação de lésbicas."


sexta-feira, 17 de março de 2017

A POLÍTICA DE IDENTIDADES LIBERAL*

A Política de Identidades dos movimentos queer e transativista é uma política neoliberal porque é uma política que ignora toda a construção histórica, material e dialética de mulher enquanto produto patriarcal derivado da dominação, exploração e redução da fêmea humana, enquanto Segundo Sexo em relação ao homem na hierarquia sexual que forja os gêneros, pra impor a autoidentificação com base na primazia do indivíduo que se autodetermina a si e a sua vontade individual como fato histórico real, ou seja, na supremacia do indivíduo sobre a sociedade (conceito de indivíduo liberal, tá meu povo?) , negando o processo histórico e dialético que constitui o(s) indivíduo(s) como pertencente(s) a determinados grupos ou identidades.

Ou seje: não há nenhuma possibilidade de reconhecer o transexualismo e identidades não binárias dentro das perspectiva materialista dialética. São categorias que só ganham sentido e significado dentro da ideologia liberal - e do discurso pós-moderno que dela se desdobra - , e que, portanto, só existem nela e a partir dela.

Lembrem-se que a ideologia liberal (e tudo que dela deriva) é uma farsa que nega e apaga as condições materiais de construção da realidade com o único intuito de manter as classes dominantes no poder, assim como à sua economia, o sistema capitalista, sustentado à custa da exploração do trabalho, do tempo, da saúde e da vida do povo pobre e trabalhado.

*Mais uma vez eu recomendo que assistam a palestra da pesquisadora Alicia Miyares, que conceitua o fenômeno transgênero-liberal dentro da política liberal na série de vídeos gravados durante o seminário da Escuela Feminista Rosario de Acuña.


domingo, 12 de março de 2017

A SEMÂNTICA DA VIOLÊNCIA CONTRA MULHERES

Nenhuma mulher é SUBMISSA a um relacionamento abusivo, à violência masculina, à violência patriarcal. Nenhuma mulher SE SUBMETE ao seu relacionamento abusivo, à violência dos homens, ao patriarcado, nós somos SUBMETIDAS a eles.

NENHUMA mulher se submete ela mesma à violência que sofre. NENHUMA mulher é agente da própria violência.

Mulheres SÃO SUBMETIDAS à violência masculina. A VIOLÊNCIA MASCULINA SUBMETE AS MULHERES. Submete emocionalmente, fisicamente, financeiramente, moralmente, psicologicamente, de diversas formas, a violência masculina submete as mulheres. E todas as mulheres que a violência masculina submete resistem a ela do jeito que podem, com a força e as estratégias que conseguem, pra permanecer vivas.

Quem submete mulheres à violência masculina são os homens. O agente da violência masculina contra as mulheres é o HOMEM.

Parem de culpar as vítimas.


NÃO EXISTE PORNOGRAFIA FEMINISTA. NÃO EXISTE PROSTITUIÇÃO EMPODERADORA.

Pornografia é uma instituição patriarcal. A própria origem da palavra e da atividade da pornografia se instituem nisso, já que, originalmente, pornografia significa escrita (ou tratado) sobre a prostituição e no momento em que foi instituída,na antiguidade, representava os discursos e narrativas que os homens criavam pra legitimar a violência sexual e a mercantilização dos corpos das mulheres miseráveis ou as escravas, que vendiam seu sexo pra sobreviver, pra subsistir (como é até hoje para a imensa maioria das mulheres na prostituição). A pornografia sempre foi a "grafia" (escrita ou imagética) da prostituição, o registro narrativo de legitimação e autolegitimação da violência masculina contra mulheres e, nesse sentido, sempre exerceu uma função pedagógica de naturalização da objetificação da sexualidade feminina e da mercantilização dos corpos das mulheres pelos homens.

A prostituição e a narrativa sobre ela, a pornografia, são instituições de desumanização da mulher, são instituições patriarcais, o que significa dizer que foram INSTITUÍDAS por ele em benefício próprio e para a sua manutenção.

Não existe instituição que seja patriarcal e feminista ao mesmo tempo porque uma coisa é a contradição da outra.

Reflitam sobre as raízes das nossas opressões, saiam da superfície do discurso e reflitam profundamente sobre elas.

MULHERES NÃO SÃO MERCADORIA!


sexta-feira, 10 de março de 2017

UMA EDUCADORA CONTRA A ESCOLA

Então, nesta postagem, o assunto não vai ser diretamente o feminismo. Mas vai ser uma análise sob uma perspectiva radical, uma análise radical sobre um fenômeno que também atinge as mulheres e meninas.

Uma coisa que vocês talvez não saibam sobe mim, ou talvez saibam, ou talvez deduzam (ou talvez eu esteja me dando uma grande importância. He he he) é que eu sou abolicionista em relação à escola também ("também" porque sou abolicionista de gênero e da prostituição). Eu sou educadora, fui professora de História no ensino formal, já trabalhei com alfabetização de adultos e com arte-educação e eu, simplesmente, abomino a escola.

Eu abomino a escola porque eu partilho da concepção que concebe que a escola, a instituição escolar tal qual a conhecemos hoje, é uma instituição burguesa, propagadora da ideologia burguesa, pois que fundada na lógica burguesa e que só pode ser concebida, significada, compreendida e mantida a partir dela. A escola é instituída, pela burguesia, para propagar os valores dominantes, por isso a divisão por disciplinas, os conteúdos escolares, a ideia de projeto político-pedagógico, a instituição e delimitação de um espaço físico exclusivo no qual a educação deve acontecer, a certificação do conhecimento por instâncias superiores, estruturas hierárquicas e hierarquizantes sem as quais a escola não poderia sequer existir, não faria sentido, não teria significado. A escola é a hierarquização da infância, do saber, da vida, esses são seus fundamentos, - e aqui eu aponto fundamento como aquilo que, apesar do tempo, do espaço, das circunstâncias e das transformações e adaptações, é capaz de permanecer e faz com que, ainda que um fenômeno se altere em alguns aspectos, continue sendo ele. Não adianta reformar a escola, porque qualquer reforma muda a forma, nunca os fundamentos - qualquer coisa que transformasse os fundamentos da escola já seria outra coisa que não a escola, seria a escola revolucionada. Fora da lógica burguesa não exite escola, rompidos os fundamentos que enraízam a escola na cultura burguesa a partir de uma tradição de instituições para manutenção e propagação dos valores e ideários de hegemonia da classes dominantes não existe escola. Há, então, uma diferença fundamental entre os conceitos e as práticas de educação e escolarização, e eu partilho fortemente da ideia de que o primeiro é incompatível com o segundo. A educação se dá em relação dialética com a vida e a com a comunidade, a escolarização se constitui como algo para fora e além dela, o que é uma farsa própria da lógica burguesa.

Quando a burguesia se institui como classe dominante, política e economicamente, ela também passou a ampliar seu projeto civilizador, já em curso antes do auge da tomada de poder, pois que justamente o possibilitou, mas que ganha força com a Revolução Burguesa. Um dos fundamentos mais fortes desse projeto civilizador está a concepção de História que essa burguesia engendrou para si. A História, grosso modo, concebida pela burguesia como a narrativa sobre si mesma, sobre seu processo de ascenção e tomada do poder, e além disso, como sendo a ascenção dos valores burgueses e da própria burguesia um progresso natural e inevitável da humanidade, de qualquer humanidade; a História como telos, ou a História teleológica. Uma das premissas mais fundamentais da instituição da História como telos da/na narrativa burguesa sobre si mesma é a criação de um sujeito narrador (no caso, a burguesia) que se coloca a-historicamente, ou seja, de fora da história para narrá-la, desta forma, a burguesia se narra e se autolegitima a si mesma (assim como a sua narrativa) como senhora da História a partir de premissas metafísicas/transcendentais que conferem a essa narrativa seu sentido teleológico. A autolegitimação da burguesia por sua narrativa teleológica, por sua vez, institui a própria História como atividade própria da burguesia, e institui a burguesia como esse sujeito a-histórico e metafísico/transcendental da História - num ciclo de autolegitimação onde não é possível - a não ser a partir do pensamento radical revolucionário e da revolução - encontrar o início ou o fim.

Desta forma, sendo a burguesia esse sujeito da História que se institui a-historicamente, também todas as instituições fundadas pela burguesia dentro dessa lógica obedecem a ela: todas as narrativas burguesas (as artísticas, as literárias as jurídicas, as pedagógicas) nas quais se imbricam todas as suas instituições (a Arte, a Literatura, o Direito, a Pedagogia e a Escola), se instituem a partir desse sujeito. Assim é a escola, a instituição burguesa em que o indivíduo deve entrar e permanecer para "se preparar para a vida", justamente porque, concebida na lógica da a-historicidade, a vida - entendida aqui como realidade material - é tudo que acontece fora da escola, e sobre a qual a escola, que está acima e além dessa realidade material através de seu sujeito pedagógico a-histórico e transcendental, deve ensinar. A escola, como mecanismo de controle social que deve estar sempre sob a posse da classe dominante, não pode, jamais, fazer parte da vida, da comunidade, da realidade em que ela é engendrada. A escola, como instituição burguesa deve se colocar acima e além da vida, da realidade, pra que continue sob o poder da narrativa da classe que a engendrou e que vai determinar seus valores e, assim, os valores da própria vida e da própria realidade, positivando alguns fenômenos e negativando outros, conforme as conveniências dos sujeitos pretensamente a-históricos que a dominam.

Vale lembrar que esse Sujeito a-histórico da História que se institui a si mesmo como toda a humanidade (a burguesia), é o Sujeito Branco, Heterossexual Falocentrado, em uma instância individual, ele é também o próprio indivíduo: o patriaca da família burguesa, que é, esta, o organismo social ao qual a burguesia institui como célula primeira e principal do ordenamento social e do Estado - fazendo propositalmente imiscuir-se ordenamento social e Estado como se fossem uma única coisa e como se apenas a partir do Estado o ordenamento social fosse possível.

A escola é a materialização do Estado na infância. E assim como o Estado, que não existe desde sempre e um dia ruirá, a escola, essa perversão da educação, vai morrer junto com a sociedade de classes.

 

Isto é apenas um breve ensaio sobre educação libertária, e eu aceito críticas, objeções, contra-argumentos, correções, complementações.


segunda-feira, 6 de março de 2017

DIA 8 DE MARÇO É DIA DE LUTA PELA EMANCIPAÇÃO DO SEXO FEMININO!

Está chegando o dia e é importante lembrar que o dia 8 de março é o dia de luta pela emancipação daquelas que pertencem à classe/casta de pessoas que têm sua existência definida, limitada e explorada pelo seu sexo e suas capacidades reprodutivas e tudo que disso se desdobra. Então, o dia 8 de março é sobre:

- A luta contra o ódio histórico milenar ao sexo feminino - a misoginia -, às nossas vulva, à nossas vaginas, aos nossos útero e tudo que é próprio desse sexo ou está relacionado a ele, a menstruação, nossas secreções, odores, a toda nossa condição feminina.
- A luta contra a hierarquia sexual que concebe o sexo feminino como o Segundo Sexo, ou o sexo inferior.
- A luta contra a Divisão Sexual do Trabalho em todas as instâncias da sociedade.
- A luta contra a exploração doméstica, sexual e reprodutiva do sexo feminino.
- Aluta contra a violência masculina contra o sexo feminino nas relações de trabalho, remuneradas ou não, nos espaços domésticos, trabalhistas e em todas as esferas sociais.
- A luta contra a maternidade compulsória.
- A luta contra a heterossexualidade compulsória.
- A luta contra a interdição social ao aborto.
- A luta contra a objetificação e exploração do sexo feminino e de sua sexualidade pelo sexo masculino.


Desta forma, o 8 de março NÃO é sobre:

- Ter um pênis e desejar ser socialmente reconhecido como mulher apesar disto e a nenhuma das implicações sociais ou políticas que disso se desdobre.
- Os desejos, demandas ou urgências do sexo masculino, em nenhuma instância.
- O sexo masculino.
-Pênis.

Vamos lembrar disso, mulheres, por favor! Não permitam o apagamento de nossa história e de nossa luta! Não permitam a secundarização de nossas pautas! Não permitam a falocentralização de nosso movimento!

VIVA A LUTA E A RESISTÊNCIA DAS MULHERES!


sábado, 4 de março de 2017

CELEBREM NOSSAS HEROÍNAS!

Desejo que todas as assassinas de homens, as que esquartejam seus maridos, as que jogam água fervendo no pênis dos machos até derreter, as que cortam seus paus com faca, as que esfaqueiam seus estupradores, as que matam o marido traidor (e que são muito poucas, porque, ao contrário dos homens em relação a nós, a gente tem pouca coragem de matá-los), desejo a todas essas mulheres o mesmo tratamento que a sociedade tem oferecido ao ASSASSINO BRUNO: espaço nas mídias pra se defender, voz pra se explicar, ofertas de emprego, redenção, atenção e acolhimento.

Mas isso NÃO vai acontecer!

Me aguardem na porta da cadeia para abraçar, celebrar e tirar selfie com Elize Matsunaga, aquela que picotou o cadáver do marido espancador, assim que ela sair de lá. Mulheres: vamos nos mobilizar em rede, nas nossas próprias redes, pra celebrar, dar voz, publicidade, emprego e acolhimento a ela. Podemos fazer isso por cada mulher que for presa por matar um homem. Seria fundamental que parássemos de esperar dos homens que não celebrem seus companheiros feminicidas e que começássemos nós mesmas esse trabalho de acolher, dar voz e celebrar cada uma das nossas que tem a coragem de matar ou incapacitar violentamente um homem.

Acordem!  Parem de esperar a compaixão e compreensão dos homens! Parem de desejar a aprovação e o reconhecimento deles!  Os homens não se comparecerão de nós e nunca reconhecerão as nossas razões e nossas causas como legítimas!  NUNCA!

Vamos criar e fomentar nossas próprias redes e acolher e celebrar nossas heroínas!

A Elize Matsunaga tá presa onde? Aquela mina que fez peneira do corpo do ex que prostituía ela depois de fazer 30 boletins de ocorrência e que foi presa por "excesso de legítima defesa", kd ela? A adolescente que esfaqueou até a morte o pai estuprador? A mulher que derreteu o pênis do marido traidor com água fervendo, onde estão essas mulheres? Que tal os sites, blogs, as revistas e mídias feministas irem entrevistá-las? Que tal as empreendedoras oferecem trabalhos a elas? Que tal a gente fazer mídias, criar visibilidade, status, celebrando como heroínas essas mulheres?

Parem de chorar implorando de joelhos a compreensão dos homens! Parem de mendigar que eles aprovem nossas razões e nossas causas, que nos compreendam, que não nos condenem, que não nos alcunhem de perversas, de histéricas, de punitivistas, porque eles não vão fazer! Vamos parar de lamentar e choramingar a aprovação deles e vamos agir!

Parem de focar nos homens!  Parem de girar em torno do falo! Vamos criar nossos próprios ícones, nossas ídolas, nossas narrativas, nossa própria história!