quinta-feira, 26 de novembro de 2015

SOBRE MULHERES E DEUSAS


É preciso que as mulheres acreditem que amam suas crias incondicionalmente para que a ideia de maternidade se perpetue. É preciso convencê-las incansavelmente que esse é o amor delas. É preciso, ainda, fazer crer que esse amor é natural à mulher e que é a essência de todo e qualquer sentido e significado para o processo de reprodução humana.

A maternidade, no entanto, é uma prisão, um instrumento de dominação de mulheres na sociedade patriarcal, sociedade que se fundamenta na compulsoriedade da maternidade como forma de dominação e exploração do corpo, da força de trabalho e da subjetividade das mulheres. Fora dessa construção, desse contexto, a maternidade não existe, não tem sentido, o que existe é apenas a reprodução sexuada de seres vivos, de seres humanos - e isso, a reprodução sexuada de seres humanos, não é uma prisão e nem deixa de ser, isso apenas é. Quem confere sentido à reprodução humana é o patriarcado, e esse sentido se chama maternidade. É possível construir outros? Claro que é, e essa também é uma luta das mulheres. Mas quando começarmos, nós, mulheres - e não mais os homens -, a construir e estabelecer outros sentidos pra reprodução humana, ela deixará de ser maternidade e deixará de carregar todos os sentidos que a maternidade, enquanto conceito patriarcal, carrega. Então penso que, numa sociedade de mulheres livres e emancipadas, a reprodução humana não terá tanta importância assim, porque ela é importante para os homens, pois perpetua o poder deles através da geração da prole (em diversos sentidos: mão de obra pra gerar de riqueza, novas mulheres pra serem escravizadas, perpetuação de ideologia através de herdeiros etc) e da reafirmação e manutenção da própria ideia de maternidade que eles criaram e que mantém como prática escravizante das mulheres e geradora de poder e riqueza pra eles.

Tenho certeza que quando todas as mulheres se libertarem da maternidade compulsória que nos é imposta para que homens nos dominem a nossos corpos e nossa subjetividade, quando todas as mulheres se derem conta que temos tantas outras potências e possibilidades mais que parir, cuidar, se anular, a humanidade chegará a seu fim.

O fim da humanidade, nesses termos, então, significa o alcance da liberdade das mulheres.

Esse é o grande temor dos homens.

Esse é, também, o nosso imenso poder.

Por isso, também, os homens fazem a guerra. Numa tentativa de se assemelharem a nós em magnitude, grandeza e poder de vida e de morte, de criação e de destruição, sem serem capazes desse poder genuinamente, transformam sua pequenez, sua miséria e frustração em guerras, dando a falsa impressão que detêm, eles, e não nós, o poder de vida e de morte. São miseráveis, invejosos e aniquiladores, pois que precisam se sentir poderosos matando e destruindo para que pareça, também, que são eles os responsáveis pela criação e manutenção da vida. Precisam destruir pra se sentirem poderosos e criadores já que, genuinamente, não o são.

Por isso também eles nos estupram, nos agridem, nos matam, por isso eles estão nos estuprando há milênios, incessantemente: para que tenhamos medo e não deixemos jamais de nos reproduzir e perpetuar o poder deles.

Por isso precisam também nos convencer que, mesmo sendo a reprodução humana um processo natural passível de diversos significados, ele tem que se converter em maternidade patriarcal para as mulheres, em algo do que elas não podem sequer pensar em abrir mão, em algo no qual elas devem depositar tanto valor, mas tanto valor, um valor acima de suas próprias vidas, de modo que a existência da mulher se justifique apenas através da maternidade.

Mas o tempo deles está acabando. E nossos corpos, nossas mentes e nossos afetos, cada vez mais nos pertencem.

Dobrem seus joelhos diante de nós, machos, criaturas vis. O poder da vida é nosso. Nós somos as deusas.

Caguem-se todos, e limpem-se, enquanto há tempo, pois um dia nossa liberdade será o mais importante valor para nós e, então, tranquilamente e sem alardes, se assim desejarmos, o fim virá.

Cês vão morrer tudo cagado, seus merda.