quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

SOBRE ÁLCOOL E O PATRIARCADO



[Se cuidem e cuidem umas das outras, meninas! O patriarcado não bobeia, e o cuidado e o autocuidado também são feminismo! ♥]

Me lembro que com 14/15 anos já consumia bebida alcoólicas, já tomava porres em festinhas e reuniões de amigos nas casas das pessoas.

Sempre fiz muito sucesso com os homens, que me diziam que eu era diferente das outras meninas, que era mais madura, mais inteligente e que por isso eles me admiravam tanto.

Eles sempre bebiam comigo, me ofereciam álcool e faziam questão de dizer o quão sexy e especial eu era e o quanto eu ficava ainda mais sexy e especial quando bebia. Não raro, ouvia "Você bebe como um homem!", e ficava extremamente envaidecida com isso - Nossa, eu realmente era diferente! Até merecia ser comparada com um deles! E meus sentimentos se enchiam de ímpeto e motivação pra agradá-los, pra continuar me esforçando pra agradá-los, pra ouvir mais vezes que eu merecia a admiração e o reconhecimento deles!

Eu me sentia muito especial mesmo. E quanto mais eles me faziam sentir especial, mas eu me esforçava pra ser especial pra eles.

Eu me sentia especial porque uma das primeiras coisas que eu aprendi na vida (pela TV, pelo discurso dos homens, pela reprodução desse discurso por outras mulheres, na escola, na literatura, no cinema) é que o maior poder de uma mulher está em despertar o desejo de um homem. Então, quanto mais eles me apontavam - com elogios e com seu pseudo reconhecimento - os comportamentos e condutas que eu precisava ter pra ser tão especial pra eles, mais eu me esforçava pra me adequar e reproduzir esses comportamentos e condutas, e, então, quanto mais [pseudo]aprovação deles eu recebia, mais poderosa eu me sentia, e quanto mais poderosa eu me sentia, mais eu reproduzia os comportamentos que os homens me ensinavam. Um ciclo de abusos, de mentiras, de engano, de manipulação, de vulnerabilização de meninas para transformá-las em presas dóceis, em subservientes, em objetos, em MULHERES, e fazê-las crer que nisso reside seu grande poder, que o grande poder de uma mulher está em se deixar objetificar com docilidade e passividade - isso é a socialização feminina.

[Esse ciclo ainda se reproduziu, com muitas outras condutas e comportamentos, sobretudo práticas sexuais, por muito tempo, até que eu conhecesse o feminismo e entendesse como os homens e a sociedade patriarcal nos transformam em objetos, nos transformam em mulheres, através da socialização feminina. Mas acabou. No entanto, as marcas que ele deixou em mim jamais serão apagadas, são marcas de violência, do sequestro e da violação da minha infância, do sequestro e da violação da minha personalidade, da minha psiquê, da minha sexualidade.]

Aos 14 anos eu já bebia todo álcool que o patriarcado me oferecia. Perdi as contas de quantas vezes fiquei bêbada, dormi, apaguei ou, simplesmente, estive com estado de consciência totalmente alterado.

Não saberia dizer quantas vezes posso ter sido estuprada. Eu tinha acabado de largar os brinquedos, há um ano atrás, eu tinha acabado de largar os brinquedos.

Não saberia dizer quantas vezes posso ter sido estuprada. Aos 14 anos. Eu tinha acabado de largar os brinquedos, há apenas 1 ano atrás.

E, então, isso é a história da Cultura do estupro e da pedofilia sendo narrada pela perspectiva das vítimas, e não dos abusadores. E isso incomoda, mas nós não vamos parar. Nós rompemos o silêncio e não vamos parar.

Não deem voz a pedófilos estupradores, deem voz às vítimas! Escutem o que as vítimas estão dizendo!  Abusadores de crianças e de adolescentes não são doentes, pedofilia não é doença, é CULTURA. Abusadores não são doentes que precisam de tratamento, abusadores são patriarcas saudáveis exercendo seu poder patriarcal sobre vítimas vulneráveis. Não tratem pedófilos como vítimas! Pedófilos NÃO SÃO VÍTIMAS, são AGENTES da CULTURA DO ESTUPRO E DA CULTURA DA PEDOFILIA.
VÍTIMAS SOMOS NÓS!

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