terça-feira, 14 de junho de 2016

SOBRE PROSTITUIÇÃO

Eu realmente queria compreender o que as liberais entendem como "agência" e "empoderamento" quando falam de uma atividade que tem como FUNDAMENTO a redução absoluta de pessoas à mercadoria.

Sim, porque caso vocês não tenham se dado conta ainda, a prostituição só é passível de ser instituída numa sociedade que tem como acordo social a existência de um grupo de pessoas que pode ser destituído de humanidade pra ser objetificado e mercantilizado.

Assim: o fundamento primeiro da prostituição - em qualquer condição -, aquele que torna possível sua existência enquanto fenômeno e fato social, é a objetificação plena do indivíduo, ou seja: a desumanização, a destituição do caráter humano da pessoa para sua redução à mercadoria.

A prostituição não pode ser compreendida a partir de explicações individualizantes. A prostituição só pode ser compreendida a partir da dinâmica sócio-cultural que permite e mantém sua existência e suas significações. Somente numa sociedade que institui e normatiza mulheres como objetos e cidadãos como consumidores a prostituição - que é fundamentalmente o acordo de autorização social para que um grupo desumanize outro e o torne objeto de suas vontades - a prostituição pode existir, pode fazer sentido e, mais: pode ser pensada como "escolha" da mulher prostituída. Fora desse contexto, de uma sociedade que vê como possível e natural a objetificação de mulheres e o direito do homem de consumi-las, a prostituição não poderia sequer ser pensada - a não ser como violência, barbárie desumanização e exploração, que é o que ela realmente é para as mulheres.

Que "agência" e que "empoderamento" pode existir numa atividade fundamentada nessas premissas? Que "agência" e que "empoderamento" podem existir em uma pessoa que "escolhe" ser desumanizada e objetificada pra ser comercializada para atender as demandas do outro? Onde liberais apontam a "agência" e o "empoderamento" eu só consigo ver um terrível erro de interpretação sobre o que a prostituição realmente é.

A perspectiva de que a prostituição pode ser uma atividade empoderadora e libertária é uma perspectiva PATRIARCAL de positivação e naturalização da objetificação e mercantilização das mulheres assim como daquilo que há de mais fundamental pra existência de qualquer ser humano: nossos corpos. É fácil para mulheres acreditarem que a prostituição pode se empoderadora e libertária porque é fácil para mulheres acreditarem nos discursos patriarcais que positivam e naturalizam o nosso subjugo aos homens e a as suas vontades: fomos socializadas pra isso.

O discurso patriarcal defende, supervaloriza e romanceia a prostituição e diversas outras violências contra mulheres por um simples motivo: interessa ao patriarcado nos convencer que sermos objetificadas e exploradas é bom pra nós, interessa ao patriarcado nos convencer disso porque é bom para os homens nos objetificar e explorar. Interessa ao patriarcado escamotear os fundamentos da exploração sexual feminina e florear a violência com falsas promessas de empoderamento e libertação porque interessa ao patriarcado MANTER as atividades de exploração sexual feminina.

O discurso e a prática feminista SEMPRE existirão no sentido de criticar e romper com os discursos e as práticas patriarcais - mesmo as mais veladas e naturalizadas - e NÃO DE REAFIRMÁ-LAS E ENDOSSÁ-LAS.

Logo, defender prostituição como libertação e empoderamento feminino é um discurso PATRIARCAL e não feminista.

Rompa com as perspectivas patriarcais sobre a prostituição e as violências contra nós, rompa com as narrativas e explicações, impregnadas de sentido patriarcal, que romantizam, idealizam, fetichizam e manipulam a realidade sobre esses temas, conheça as perspectivas, as narrativas e os sentidos que as mulheres e as feministas produzem sobre a prostituição e outras violências naturalizadas pelo patriarcado contra nós. Leia, pesquise, investigue, ouça as mulheres. E privilegiem nossas narrativas e produções de sentido sobre a realidade em vez de valorizar as explicações fundamentadas nas perspectivas de homens.




"Dizer que as mulheres têm o direito de se vender, é disfarçar o fato de que homens têm o direito de comprá-las" - Maud Olivier

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